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Crónica de Francisco Guerreiro

Repensar a aquicultura - Capítulo III

Qua, 15/02/2023 - 10:08

Retomando o tema vou mostrar, factualmente, porque é que a aquicultura como existe é um problema social, económico e alimentar e não uma solução.

Retomando o tema vou mostrar, factualmente, porque é que a aquicultura como existe é um problema social, económico e alimentar e não uma solução.

Globalmente (dados de 2017 mas abaixo dos valores actuais) a captura de animais marinhos foi de 179 milhões de toneladas, sendo 97 milhões apanhados em pesca tradicional e industrial, e os restantes 82 milhões produzidos em regime de aquicultura. Este sector contribui com 22% de produção deste tipo de bens alimentares na União Europeia. Entre as espécies produzidas podemos encontrar trutas, douradas, carpas, robalos. Ora, muitas destas espécies em regime de aquicultura são carnívoras e por tal requerem sistemas intensivos de produção tal como uma alimentação baseada em rações e óleos (produzidas com pescado capturado no mar). Esta tendência de usar rações e óleos (fishmeal and fish oil) em aquicultura não é uma excepção mas a regra. A tendência de uso deste tipo de alimentação é de 69.5% sendo que apenas 30.5% das espécies em aquicultura se alimentam apenas dos nutrientes que encontram na água.

E um dos grandes anacronismos (alguns podem conotar como loucura) é que nalgumas espécies são precisos mais quilogramas de pescado para gerar apenas um quilograma de pescado em regime de aquicultura o que leva a um défice em todo o sistema nutricional e alimentar. Pior, muita desta pesca, e posteriormente processamento de rações e óleos, é feito em regiões costeiras Africanas e na América Latina. Nestes locais, infelizmente, as regulamentações tal como os controlos ambientais, fitossanitárias e ligados ao respeito pela dignidade humana no trabalho são muito questionáveis.

Existe assim uma pressão gigantesca sobre os recursos destes países o que leva muitas comunidades a ficarem sem acesso a pescado, a uma precarização do trabalho e a uma degradação ambiental profunda. Mas no meio de tanta irracionalidade existe espaço para o sector da aquicultura? Falarei disto no próximo artigo de opinião. 

Texto: Francisco Guerreiro 

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