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Crónica de Carlos Leitão

A eleição de Deus

Qua, 13/01/2021 - 17:25

Não parece, mas há uma contagem decrescente a decorrer para eleger o novo Presidente da República Portuguesa.

Não parece, mas há uma contagem decrescente a decorrer para eleger o novo Presidente da República Portuguesa. Da esquerda à direita e de cima a baixo, perfilam-se como galgos as mulheres e os homens que querem ver o Tejo do Palácio de Belém. Há, todavia, qualquer coisa lamacenta que abranda o fulgor e desencoraja a horda de portugueses, outrora famintos do direito ao voto.

A renovação do mandato Rebelo de Sousa está iminente e já só falta saber percentagens sufragistas. Temos eurodeputadas a querer voltar para os braços da Pátria-Mãe, um desconhecido liberal e um comunista bem-apessoado, um pedreiro e um comentador de bola. Dos debates que vi, perdi-me entre o enfado e a verborreia, e quando o suplício termina e se aclamam moderadores, então a vitória consagra-se sem vencedores. Estranho.

Estranhar-se-ia a mansidão popular, não fosse o seu próprio desinteresse. Se há culpa nos pobres programas escolares, também a ignorância dos petizes que crescem com objectivos endinheirados e com o verbo “ter” assusta um pouco mais. Ser feliz é coisa bela e simples, e não se sonha numa app ou na Netflix. Pena é que a militância fique na gaveta, bem por baixo do computador que todos querem ter, e os políticos já nem precisem de correr para provar que por bem vieram.

Pensar um país é inusitado e dá trabalho. Não basta uma Greta nórdica e a adolescência mais rebelde que sabe de todos os seus direitos. Convém saber dos deveres, mesmo que seja pela Internet.

Viciámos os dados com a ilusão e a vertigem de uma democracia evoluída e, agora que o Capitólio se enche de primatas “rednecks”, damos as boas vindas a Marine Le Pen e gargalhamos, com a parvoíce de quem brinca com o futuro e com o passado.

Numa campanha presidencial em que os candidatos querem, na verdade, ser o primeiro-ministro, o indivisível Marcelo – que até nem queria candidatar-se a um segundo mandato, diz-se – calcorreia serenamente os corredores de Belém, de mão dada a Costa e sorriso confiante. São mais cinco anos de democracia. Depois, rezem crentes e ateus porque, a avaliar pelo comportamento humano do nosso querido Portugal, toda a ajuda vai ser precisa.

Votemos, por agora. Pelo menos, isso.

Texto: Carlos Leitão, fadista

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