Nacional
Crónica de Carlos Leitão

“Almoço de Domingo” com Rui Nabeiro

Qui, 08/04/2021 - 15:48

O legado do Sr. Rui Nabeiro garante-se todos os dias, sem a necessidade de calcar e subir aos bicos dos pés para ver mais longe.

Ser grande num mundo de pequenos será sempre uma questão suplementar para quem definiu cedo a prioridade humana como porta-estandarte de tudo o resto que viesse. Aos 90 anos, o Sr. Comendador Rui Nabeiro abraça muito mais que o tempo, tem no colo uma região inteira e o nome de um país que levou pela mão a Espanha, ainda novo, para fintar o cinzento-escuro da época que teimava em sujar o dourado de um Campo Maior alentejano.

Rui atravessou a fronteira e afrontou a carência com a braveza estóica de quem sabe fazer bem e melhor mais vezes, sem o premeditar. O Alentejo foi celeiro de tanta coisa, principalmente da capacidade melancólica de não sonhar, mas a sua perseverança marcou e marca a cadência dos dias, sem que as rodas mais ou menos dentadas do progresso lhe atravanquem o destino.

Família, amigos e colaboradores, todos lhe reconhecem a grandeza, e não há bolor político ou ávida mesquinhez que lhe arranquem das mãos o escopro e o martelo com que tem esculturado o caminho, mostrando ao mundo como se nasce e cresce, sem morrer.

José Luís Peixoto romanceou-lhe agora a vida no livro que hoje começo a ler, mas que ao seu desfecho me escuso de aguardar para ter a certeza da mestria do escriba e do sumo do enredo. Romântica e bela esta forma de enaltecer a vida de um homem diferente dos outros, em Almoço de Domingo. Se o escritor é o responsável pela minha cobardia de nunca ter lido o seu Morreste-me, já a vida ganha mais encanto com esta prova irrefutável de 90 anos de amor, e de como essa pode (e deve) ser a semente de tudo o que depois germine.

O legado do Sr. Rui Nabeiro garante-se todos os dias, sem a necessidade de calcar e subir aos bicos dos pés para ver mais longe. Nada disso passa a essencial, antes a janela aberta ao horizonte dourado de um trigo que não lhe ceifa o sonho, e onde cabem todos os que por bem chegarem para perpetuar este Homem como um dos maiores de todos nós. Longa vida!

Texto: Carlos Leitão, fadista

 

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