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Crónica Carlos Leitão

Liberdade ao fadista!

Sex, 21/01/2022 - 16:45

Achamos sempre que não nos toca a nós, mas o sacana do bicho entrou-me pelo corpo adentro e, sem fazer alarde, borrifou-se no álcool-gel e na máscara que tão ordeiramente adoptei há dois anos como acessórios indispensáveis de moda, e minou-me as entranhas derrubando este corpo alado por dois dias e meio.

Achamos sempre que não nos toca a nós, mas o sacana do bicho entrou-me pelo corpo adentro e, sem fazer alarde, borrifou-se no álcool-gel e na máscara que tão ordeiramente adoptei há dois anos como acessórios indispensáveis de moda, e minou-me as entranhas derrubando este corpo alado por dois dias e meio.

O menino ainda deu luta, mas o vírus instalou-se, e o SNS desencantou-me da liberdade por sete dias. Descansei no oitavo, o que equivale a dizer voltar ao trabalho porque de remanso estava o corpinho farto, e dando graças à vacinação por o estrago não ser grande, cantei com alma nova este fado de ser fadista.

Por falar em fado, do mais vil e triste, durante a privação, deleitei-me com os debates televisivos, rounds de vinte e cinco minutos, excepto para Rio e Costa que tiveram direito a tratamento VIP e inspirações americanas do bipartidarismo, ainda que coloque no primeiro lugar do pódio a (quase) luta de rua entre Chicão e Ventura, exemplos maiores do que foi uma pançada de brejeirice a empurrar-nos para as cordas.

Descobri Bruno de Carvalho, ainda presidente, mas agora de um misto de anónimos famosos, a mostrar os trunfos do bom sentido de humor a um país cansado de COVID e das hordas de sanguinários que lhe querem tão mal, e até o Jardel tem uma barriga como a minha. Portugal riu-se e conta os dias para saber se é o PS a coligar-se com o PSD ou se é o PSD a coligar-se com o PS, agora que a campanha ganha asas e veio para a rua disponibilizar-nos os habituais tesourinhos deprimentes da ocasião.

Eu contei os dias para a liberdade, à moda do nosso comparsa Rendeiro que anda pela diáspora a ver se escapa às ameaças sexuais do presídio onde vai vivendo como pobre banqueiro. Um a um, chegaram e foram embora os dias de clausura, sujeitos à febre e ao pijama, à inércia e ao mal-estar, mas o bicho lá perdeu os sentidos, e o menino reergueu-se, arregaçou as mangas, e agora é trabalhar, votar, amar e lutar!

Ao oitavo dia, saí a assobiar a liberdade na ponta dos dedos, e espero que a lufada seja para ventos melhores para todos nós. Na dúvida, é melhor olhar à volta e não facilitar. Obrigado pela oportunidade!

Texto: Carlos Leitão, fadista

 

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