Nacional
Bruno Candé

Homicida de ator não está arrependido: «Em Angola, matei vários como este»

Sáb, 01/08/2020 - 18:00

O alegado homicida do ator Bruno Candé, morto com 4 tiros numa rua de Moscavide, está detido na prisão de Lisboa.

Bruno Candé Marques morreu no passado dia 25 com quatro tiros. O alegado homicida do ator já foi presente ao Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa e, apesar de se ter remetido ao silêncio, os contornos do crime que terá cometido em Moscavide (Loures) valeram-lhe a medida de prisão preventiva. De acordo com o Correio da Manhã, Evaristo Marinho, um auxiliar de enfermagem reformado com 76 anos, foi levado para a prisão de Lisboa e não mostrou qualquer sinal de arrependimento.

«Em Angola, matei vários como este», terá dito Evaristo na altura da admissão.O criminoso recebeu tratamento médico após o homicídio devido a ter sido agarrado por populares depois de disparar contra o ator. Contudo, apesar dos 76 anos, o antigo combatente na Guerra do Ultramar não mostra debilidade física e anda sem qualquer apoio.

Evaristo foi levado para a ala F da cadeia de Lisboa. Este é o espaço onde os detidos cumprem quarentena preventiva devido à pandemia de covid-19. Tem uma hora de recreio diário e come na cela. Segundo o Correio da Manhã, o homem recebeu um saco com roupa da família, na passada quinta-feira. Depois de cumprir os 14 dias de quarentena, Evaristo deverá ser transferido para a ala C da prisão para se juntar aos reclusos mais velhos.

Figuras públicas revoltadas

Nas redes sociais, várias figuras públicas manifestaram a sua indignação. «Foi um crime de ódio – contra um actor, um pai, e decerto que neste país tão não-racista, haverá quem tente inventar “justificações” para o crime (“na volta ele provocou o outro”). Mas nada justifica isto: Bruno, 39 anos, artista, pai de três filhos, todos com idades abaixo dos cinco anos, foi rasteirado por um monstro que, depois de o mandar ao chão, disparou contra ele. Já há dias que o assassino o insultava, e já tinha agredido a cadela que acompanhava Bruno para todo o lado. Tendo em conta que o monstro tem 80 anos, não será difícil que a prisão lhe seja perpétua, como merecido. Que a justiça se faça. E um grande abraço solidário para a família e amigos do Bruno.», escreveu Nuno Markl.

Sandra Faleiro, numa curta mensagem, salientou: «Há racismo em Portugal! Ainda temos um longo caminho a percorrer…». Paula Lobo Antunes lançou a pergunta: «E agora? É só lá fora?».

O ator Nuno Gil reforçou que Candé foi «assassinado na rua com um facilitismo aterrador». «O porquê da sua morte é mais que atroz, repugnante, e revelador de como há um racismo sistémico em Portugal. É esta permissividade invisível que assusta, que prolifera, que vai ganhando terreno. Querido Bruno, muita paz para a tua partida».

Bruno Candé sofreu acidente em 2017 e esteve em coma

Na página oficial de Facebook da Casa Conveniente, companhia de teatro dirigida por Monica Calle e à qual pertencia Bruno Candé, está uma biografia que descreve o percurso do ator. «Uma força da natureza, uma gargalhada e uma alegria contagiantes, um coração gigante. Pai de 3 filhos, o Ivo, o Ruben e a Bia».

Candé nasceu em Lisboa em 1980 e começou a fazer teatro na Casa Pia. «Em 1995 foi convidado a frequentar o curso de teatro do Chapitô com Bruno Schiappa, onde participou em vários espetáculos. Começou a colaborar connosco, Casa Conveniente em 2011 com o espetáculo A Missão – Recordações de uma Revolução encenado por Mónica Calle e com o qual ganha o prémio de melhor espetáculo do ano em 2012. Foi ator dos espetáculos Macbeth, O Livro de Job, Rifar o Meu Coração, A Sagração da Primavera, Noites Brancas de Mónica Calle; Drive In de Mónica Garnel,  Atlas de João Borralho e Ana Galante. Trabalhou ainda com José Miguel Vitorino, Inês Vaz. O Candé fez ainda cinema com direção de Margarida Cardoso e televisão», pode ler-se.

«Hoje [sábado] dia 25 de Julho de 2020, o Candé estava sentado num banco, a passear a Pepa, a sua cadela, e um homem – com quem aparentemente tinha tido uma discussão por causa da Pepa, na passada quarta feira, – saiu de um restaurante, depois de almoçar, e disparou 4 vezes sobre ele», acrescenta ainda o grupo de teatro.

O mesmo post relembra ainda o acidente que, há 3 anos, deixou o ator incapacitado. «Em 2017, Candé sofreu um acidente grave e esteve em coma, tendo perdido a memória e capacidades motoras. As primeiras palavras de que ele se lembrou foi o texto do espetáculo A Missão de Heiner Muller. Neste momento, a Casa Conveniente e Zona Não Vigiada têm trabalhado num novo projeto – O Escuro Que Te Ilumina, a partir da vida e recuperação do Candé, que está a ser preparado para 2021. No dia de hoje, torna-se certo que este projeto vai acontecer, com uma nova força».

Texto: Joana Ferreira e Raquel Costa; Fotos: Reprodução Instagram

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