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Talento Nacional

Eles triunfaram fora de Portugal

Ter, 16/04/2013 - 12:12

Músicos, atores, modelos, realizadores e escritores portugueses fazem furor fora do nosso país... Mas aqui, ninguém sabe quem eles são. Conheça alguns dos talentos que gostavam de ter oportunidade de trabalhar na sua pátria.
Aí, o reconhecimento seria perfeito.

Sou totalmente português, os meus pais é que vieram de Moçambique... E os meus bisavós eram de origem indiana”, sublinha o escritor de 34 anos Rafic Daud, autor do livro Persian Pearl Tulip [um tipo de túlipa persa. A antiga Pérsia corresponde ao Irão], uma obra que está a fazer furor no Médio Oriente, mas ainda não está editada aqui. Foi redigida em inglês, e está a ser consumida por leitores ávidos da Índia, Egito, Qatar, Paquistão e Iraque, onde a história se passa.

O romance “gira em torno de um poema, de Hafez, um poeta persa sufi do século XIII” [sufismo – corrente mística e contemplativa do islão]. Os iranianos e naturais de outros países daquela região do planeta costumam usar, ainda hoje, um livro de poesia deste sábio da Idade Média para antecipar o futuro, num ritual que muitos casais empregam, “meio a sério, meio a brincar”, para descobrir o futuro da relação. A obra de Rafic viu a luz do dia há dois anos e é a sua primeira, mas já está a trabalhar na segunda. Não se dedica em exclusivo à escrita porque isso não é possível – ganha a vida como empresário, trabalhando com fundos de investimento.

Mas por que foi que o autor, português, elaborou este enredo em inglês? “Para ter maior projeção internacional, mas também porque foi redigido para os olhos de uma pessoa em particular, que só poderia lê-lo nessa língua. O objetivo era eternizar a história de amor que relata.” Agora, o próximo passo é traduzi-lo para português, este verão, e editá-lo cá (ainda este ano)...

Mas há narrativas diferentes: de profissionais portugueses que atingiram sucesso no estrangeiro mas não querem ser conhecidos, nem aqui nem lá fora. É o que acontece com o português Mr. Dheo, que, entre outros trabalhos, desenhou umas famosas chuteiras de Balotelli – só que ninguém sabe quem ele é na verdade, porque oculta a sua identidade perante o Mundo...

Ao contrário dos outros casos de que falamos, como o de Shina. É por ter duas nacionalidades, a nossa e a francesa, que a cantora (foto em cima), de 33 anos – um número de que gosta – sente que é “50/50”: metade dela pertence aqui, o resto ao país de Hollande (mas os pais são totalmente lusitanos). Nasceu na pátria dos croissants e passou lá toda a existência, mas costuma ficar muito tempo aqui nesta ponta da Europa.

Começou nas lides musicais quando era criança: “Sentava as bonecas ao meu colo e cantava para elas, ainda antes de falar.” Anos mais tarde, interessou-se pelo estudo da música e do fado, e na última década foi cantando para audiências cada vez maiores. Também era enfermeira, “só que já estava a ter muitos concertos, não dava para fazer as duas coisas. Tive de escolher. E neste momento já consigo viver, sem problemas, da música”.

Apesar dos muitos anos nos palcos, o primeiro álbum, Sinto-me Fado, saiu agora. “Precisei de tempo, para adquirir maturidade e colocar os temas certos. Queria fazer um trabalho com qualidade, selecionar os melhores para colaborar comigo. É um LP parecido com o que eu sou.” Nos espetáculos de Shina há portugueses e franceses no público (“em quantidades quase iguais”) e pessoas de várias nacionalidades.

Muita gente que adora ouvi-la cantar, mas se as letras forem todas em português, só percebem o sentimento, não as palavras. Por isso, já tem vários fados em francês, sempre presentes nos concertos. E quando se trata de canções em português (a maioria), começa com uma breve introdução e tradução, que ajuda todos os espectadores a perceberem melhor o que se vai ouvir. O português, afirma Shina, “é uma língua do futuro, e a sua projeção mundial ainda não terminou”.

O rosto mais bonito do Mundo

Ser modelo internacional nunca passou pela cabeça de André Costa, e isso só aconteceu por causa das brincadeiras dos amigos, que o desafiaram a entrar em concursos. Hoje, “sucesso mundial sem agenciamento no país onde nasceu” (que nem sabe quem ele é) é uma descrição que vai de encontro às medidas deste manequim de 23 anos.

Em 2011 conquistou o prémio Best Model Portugal, representando­-nos na Turquia, na competição Best Model of the World, e alcançando naquela nação o estatuto de detentor da cara mais bonita do concurso Best Face of the World. Este ano, já protagonizou a campanha internacional de primavera/verão da marca americana Bespoke.

O manequim afirma que se sente bastante orgulhoso: “O meu trabalho é reconhecido no estrangeiro, o que foi sempre uma das minhas ambições. Mas sou português, já representei o meu país com sucesso em concursos internacionais de moda e beleza, e sinto que ele não me abriu até à data as portas devidas.

No entanto, tenho esperanças de que ainda me acolha da mesma forma, ou melhor até, do que me acontece no estrangeiro, quase como uma criança espera sempre o abraço do seu pai.”

O jovem acredita que aquilo que falta aos nossos talentos, seja na moda, no cinema ou em qualquer forma de arte, é “oportunidade e apoio”.

Os alemães gostam dele

Os conterrâneos de Angela Merkel conhecem Telmo Pires melhor do que nós, mas, com cinco anos, ele dominava o gira­-discos dos pais, e aos nove tinha aulas de piano. Cantou, tocou em bandas e fez concertos até aos 18.

Depois dedicou­-se ao teatro e escreveu músicas e letras. Aos 40, é um cantor internacional, mais do que uma voz portuguesa... Os seus temas destacam­-se na Alemanha e em França.

O seu LP Fado Promessa levou mais de um ano a ser gravado, mas teve a colaboração de vários músicos prestigiados, como António Pinheiro, que trabalhou com Variações e com os Madredeus.

O artista explica­-nos que o seu percurso lá fora “está diretamente ligado ao facto de ter vivido muitos anos no estrangeiro. Os últimos dez, por exemplo, foram em Berlim”. Foi longe da pátria que este homem dos palcos começou a sua carreira, gravou as suas músicas e fez teatro.

Agora, finalmente, foi lançado o seu primeiro LP (Fado Promessa) em Portugal: “Estou a dar os primeiros passos nas salas portuguesas, e sinto­-me feliz por o meu trabalho estar a ser tão bem aceite. Parece ser necessário afirmarmo­-nos primeiro no estrangeiro para sermos bem recebidos aqui.”

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