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Quando Nada é Suficiente

Os dramas por trás da fortuna e da fama

Seg, 15/09/2014 - 11:55

As gargalhadas do ator
Robin Williams, que
acabou com a própria vida,
escondiam a dor de um
homem que aparentemente
tinha tudo mas que, na verdade,
sofria com uma profunda depressão.
Infelizmente, este está longe
de ser um caso único...

O que pode levar uma pessoa que alcançou os objetivos que traçou para a sua vida, reconhecimento, talento e carinho de milhões de pessoas, a acabar com a própria vida? Essa terá sido a questão colocada por muitos perante a morte de Robin Williams. O ator suicidou- se a 11 de agosto, na sua casa na Califórnia, por método de enforcamento.

O Mundo ficou chocado por descobrir que um dos homens mais hilariantes que já conheceu, na verdade escondia uma profunda depressão que lhe tirou a alegria de viver. O caso de Williams, talvez por ser o mais recente ou o mais mediático, voltou a trazer ao debate público a questão da depressão e os efeitos que tem.

Segundo o Portal da Saúde, a depressão é uma doença mental “que se caracteriza por tristeza mais marcada ou prolongada, perda de interesse por atividades habitualmente sentidas como agradáveis e perda de energia ou cansaço fácil". Trata-se da “segunda causa de perda de anos de vida saudáveis entre as 107 doenças e problemas de saúde mais relevantes”.

Depois do choque inicial com a morte de Robin Williams, é altura de tentar perceber o que leva alguém, aparentemente satisfeito com a sua vida, a desaparecer pelas próprias mãos. Até porque este não é um caso inédito... Falta sempre qualquer coisa... Todos nós já sentimos a pressão da vida que escolhemos, seja a nível profissional ou a nível sentimental.

A vida pode tornar-se demasiado complicada, levando a momentos de enorme tristeza, por vezes contemplando o suicídio como forma de escape. As celebridades não são diferentes. Vivem as suas vidas lidando com os holofotes do mediatismo diariamente. “Não conheço dados científicos que apontem para uma relação direta entre a fama e o suicídio”, começa por dizer o diretor do Programa Nacional para a Saúde Mental, Álvaro de Carvalho. “Contudo, pode acontecer que algumas pessoas façam um investimento acentuado em si próprias, procurando chegar denodadamente à fama e ao sucesso. Nessas circunstâncias, um falhanço rotundo ou uma mera presunção de desaire podem levar ao desespero, à descrença numa solução. Em sequência, por caírem num estado progressivo de depressão profunda, podem contemplar uma ideação suicida como forma de escape de uma vida que se torna amargurada”, refere Álvaro de Carvalho.

No caso de Alexander McQueen o problema já vinha de trás mas foi espoletado pela morte da mãe, Joyce, como referem vários amigos do estilista, falecido em 2010. Considerado como um dos mais famosos e talentosos da sua época, McQueen viveu no centro do mundo da moda, compactuando com os conhecidos exageros festivos.

Segundo várias publicações, a morte (também por suicídio) da grande amiga e musa Isabella Blow, a pressão para apresentar a nova coleção que tinha criado, os relacionamentos falhados, o uso de estupefacientes nos últimos anos, levaram o criador a entrar numa fase depressiva, apesar de ter mantido a situação escondida dos principais amigos. “A experiência mostra que algumas pessoas para quem asexpectativas alheias, a pressão mediática e o dinheiro parecem ser o prioritário na vida, têm mais dificuldade em aceitar e gerir adequadamente as deceções, desaires, contrariedades, inevitáveis ao longo da vida”, refere Álvaro de Carvalho.

Apenas com a morte da mãe é que os problemas de Alexander McQueen começaram a ser evidentes, revelando total devastação sentimental. Aliás, o estilista faleceu um dia antes do funeral da progenitora.

Estatísticas internacionais baseadas em autópsias psicológicas mostram que pelo menos 60% das pessoas que concretizam suicídio sofrem de uma depressão maior, a forma mais grave, mas felizmente não a mais frequente, de doença depressiva”, diz Álvaro de Carvalho. Já o caso de Tony Scott, famoso por ter realizado Top Gun, é ainda mais evidente dos efeitos imediatos de uma depressão e quão escondida consegue ficar, até dos entes mais próximos.

No dia 19 de agosto de 2012, o realizador parou o seu carro na ponte Vincent Thomas em San Pedro, na Califórnia, saltou a vedação de segurança e, sem hesitação, saltou para a morte. Com 68 anos, uma carreira de sucesso, novos filmes a caminho e um casamento feliz, Tony Scott deixou um bilhete de suicídio no seu escritório e outro no carro com indicações a quem as autoridades deveriam contactar. Na autópsia foram encontrados vestígios de medicamentos antidepressivos, uma tendência que tem vindo a aumentar nos últimos anos, e que afeta qualquer pessoa independentemente do seu estatuto social.

Como diz Álvaro de Carvalho, “depende, quer da estrutura de personalidade de base – há quem seja famoso sem cultivar esse estado –, ou da existência, como em qualquer outra pessoa, de predisposição para doença mental, expressa ao longo da vida por episódios depressivos ou bipolares. Nunca é a presença ou ausência de fama que torna as pessoas imunes a eventuais crises existenciais”.

Veja-se Kurt Cobain. Em 1994, o vocalista dos Nirvana decide acabar com a vida aos 27 anos. Como outros ícones antes de si (Jimi Hendrix, Janis Joplin), o jovem alcançou a imortalidade através das memórias e da sua simbologia mais do que como homem. À frente da mais famosa banda do Mundo na altura, Cobain tornou-se a cara de um movimento rock-grunge, sem nunca o desejar, algo que sempre expressou nas suas letras e em inúmeras entrevistas que deu. Associado a esse fator, padecia de doença bipolar desde a adolescência – existiam antecedentes familiares.

O constante consumo de álcool, drogas e cansaço físico aumentaram o número de episódios maníaco-depressivos de Cobain, que culminaram no seu suicídio na sua casa em Seattle. “Não consigo ultrapassar a frustração, o sentimento de culpa e a falta de empatia que sinto por todas as pessoas. Acho que amo tanto as pessoas que isso me faz sentir demasiado triste”, pode ler-se na carta que escreveu antes de tirar a vida.

Tal como qualquer outra pessoa, os famosos não são imunes a problemas emocionais, que se podem traduzir em momentos de maior tristeza, contemplando o suicídio como solução, como fez Halle Berry. Com o fim do casamento de cinco anos com David Justice, a atriz tentou matar-se por envenenamento com monóxido de carbono de um carro. “Estava no meu carro à espera do gás quando tive uma visão da minha mãe. Ela sacrificou tanto pelos filhos e acabar a minha vida assim seria um ato tão cobarde. Foi tudo por causa do relacionamento. O meu sentimento de valorização pessoal estava nos mínimos. Só porque alguém deixou de me amar não quer dizer que nunca mais encontre o amor”, revelou anos mais tarde numa entrevista.

Também o ator Owen Wilson sucumbiu aos demónios mais negros da sua vida, tendo conseguido sobreviver a uma tentativa de suicídio. Tal como o colega de profissão, Robin Williams, o ator fez da comédia uma carreira de sucesso, procurando fazer rir os outros na grande tela. Ao contrário de Williams, as suas tendências depressivas e maníacas eram mais evidentes, tal como vários amigos próximos revelaram, depois do que aconteceu em 2007. “Ele tanto podia estar a passear na praia com a sua cadela e a meter-se com miúdas, como no dia seguinte, não atender o telefone e fechar-se em casa durante uma semana sabe Deus a fazer o quê”, contou um amigo próximo da família.

A situação agudizou-se com a separação mediática de Kate Hudson, também atriz, com receio de que Wilson voltasse ao consumo de drogas (um historial que tornou público anos antes). Talvez tenha sido um acumular de ideias, pensamentos, sentimentos ou simplesmente expectativas para a sua vida – chegou a dizer: “Sempre imaginei que com 30 anos estaria casado e a começar uma família, mas pelos vistos as coisas não correram como esperava” – que levaram o ator a tentar suicidar-se.

A verdade é que esta é uma doença que afeta qualquer pessoa. Por vezes silenciosa, outras evidente, a depressão e o suicídio não escolhem idade, cor da pele ou quanto dinheiro temos na carteira.

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