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Internet

O seu filho passa demasiado tempo lá?

Ter, 13/01/2015 - 11:33

Muitos jovens vivem os dias a navegar, “agarrados” às redes sociais e aos videojogos.
Sem regras nem horários estipulados pelos adultos, acumulam insucessos escolares
e sofrem quando ficam privados do “vício”. Um problema global e que já é resolvido
em Portugal – tal como no estrangeiro – com tratamento e internamento especializado.

A Internet tornou-se parte integrante das vidas das crianças e jovens ao nível mundial. Têm acesso às novas tecnologias cada vez mais cedo e até parece que já nascem ensinados a mexer em computadores, tablets e telemóveis.

De acordo com um estudo europeu, Portugal ocupa o segundo lugar no ranking dos mais dependentes da Internet, numa lista de 25 países, em que as faixas etárias dos visados vão dos nove aos 16 anos (ver infografias). Ainda assim, passar muito tempo online não é necessariamente sinónimo de que uma criança tem problemas relacionados com o uso da Net.

Esta é, aliás, uma discussão entre muitos especialistas e estudiosos do comportamento dos jovens, que continuam em desacordo em relação ao abuso da rede. A Organização Mundial de Saúde não reconhece a patologia e, por essa mesma razão, os termos “vício” e “dependência” são polémicos e usados com cautela por quem trata destes casos, sendo que muitos deles preferem falar em adição. Porém, no dicionário de língua portuguesa “adição” é sinónimo de dependência física ou psíquica.

Numa coisa todos estão de acordo: há sinais que merecem a atenção dos mais velhos e há regras que devem ser impostas aos mais novos. A vigilância e o acompanhamento por parte dos educadores podem fazer a diferença e evitar que um simples hobby se torne numa adição ou dependência perigosa.

E para quem acha que não existe em Portugal este tipo de problemas que implicam tratamento e internamento, desengane-se. Há jovens a frequentar consultas de patologia aditiva sem substância e pais e avós que não sabem como lidar com as situações.

Luís Duarte Patrício é psiquiatra e pelo seu consultório passam muitos miúdos a precisar de ajuda. Do uso ao mau uso e abuso da Internet vai um longo passo, mas, quando começa a provocar estragos ao nível pessoal, familiar e até financeiro, então, estamos perante um caso de adição à rede. “O consumo excessivo da Internet e das redes sociais pode ser um comportamento de risco aditivo quando adquire uma tal dimensão que passa a ser a principal atividade do utilizador, em detrimento de outras atividades, prazeres e responsabilidades. E sim, já há comportamentos de adição às redes sociais.”

Do grupo de pessoas mais vulneráveis a comportamentos de abuso e possível dependência estão “as mais inibidas, deprimidas, familiarmente ou socialmente mais isoladas, com dificulda-des escolares, os menores e os adultos e idosos que estão numa situação psicológica de maior fragilidade”, responde o especialista, revelando como confirmar se o seu filho ou neto é “viciado” em Internet. 

Vício é um conceito moral. No âmbito da saúde falamos de adição, ou seja, a junção do uso de um comportamento ou substância psicoativa, situação que pode desencadear a dependência. E confirma-se a dependência quando na ausência do uso surgem manifestações psicológicas que denunciam sofrimento e que temporariamente melhoram com novo uso. Quando o dependente está em situação de privação aguda por ausência de consumo pode sentir uma necessidade intensa de voltar a usar, pode sentir crescente ansiedade, irritabilidade...

Não existe um número de horas “saudável” para os miúdos estarem online, mas, como salienta Luís Patrício “devem existir pausas, respeito pelas prioridades e por outras atividades fora da máquina, bem como o respeito pelos horários da família.”

Os conselhos para os pais passam, essencialmente, pela prevenção: “Deve conversar com o seu filho sobre o bom uso e uso indevido de Internet. E, depois, se há pais que não sabem navegar, então era bom que aprendessem. Se partilharem conhecimentos ficam mais próximos também nessa área.”

A Casa de Saúde de Carnaxide é uma das poucas clínicas em Portugal que já trata desta adição na Unidade de Aditologia e Patologia Dual. Um projeto recente – criado em 2011 pelo psiquiatra:  “Temos tido jovens em tratamento, internamento e ambulatório e os resultados são animadores. Saliente-se que por detrás do abuso de Internet e videojogos há outras patologias que têm de ser tratadas para prevenir a recidiva.”

Embora esta seja uma clínica privada, as pessoas com poucos recursos económicos não devem ignorar os sinais que os filhos lhes dão: “Há equipas nos serviços públicos onde há profissionais com competência. Mas há que reconhecer que, em patologia aditiva sem substâncias, nem todas as equipas estão preparadas”, adverte Luís Patrício, autor de livros e fundador do blog maladaprevencao.blogspot.pt, onde muitas vezes esclarece pais com dúvidas sobre o tema.

Rosário e João Nascimento têm dois filhos, de 12 e 16 anos, e fazem parte do grupo de pais que sabe bem os perigos do uso da Internet. Por isso mesmo lá em casa há limitações.

Eles só podem usar ao fim- -de-semana e se tiverem trabalhos da escola que precisem de Internet dizem-me e fico de vigilância”, refere a mãe, que acrescenta que os jogos, sim, são um vício: “O mais velho utiliza as redes sociais para falar com amigos e entrar em desafios com desportistas. Varia do computador para a consola e gosta de ler e de sair. O mais pequeno é viciado nos jogos e no Youtube e ele, sim, preocupa-me mais, porque é capaz de estar horas num programa a ver jogar e fica parado a olhar. Mas temos regras: ao fim de algum tempo desliga e vai fazer outra coisa”.

O pai, João, confessa que tem um truque para controlar o que os miúdos andam a ver: “Verifico o histórico de navegação.”. Se por alguma razão este pai não permite que os filhos se liguem à Internet ou às consolas de jogos, a reação é imediata: “Ficam chateados.”. Na escola são ambos bons alunos e nunca baixaram o rendimento. ”Porque têm o tempo controlado, de outro modo baixavam de certeza”, diz João.

Rosário deixa um conselho: “A comunicação é muito importante, entrarmos em brincadeiras com eles, assistirmos ao mesmo filme e sairmos todos de casa e viver a vida”.

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